O homem suspirou de alívio. Pelo menos aquele não estava mal disposto como os anteriores. Decidiu averiguar a situação, perguntando:
- Ouve lá, ó jóquer, o que é que se passa com o resto das cartas? Estão todas zangadas e sem paciência, como o valete de paus e a rainha de copas?
- Parece que sim - respondeu o jóquer. - Embora aqueles dois sejam os piores. O valete de paus, porque na família dele resolvem tudo à paulada e a rainha de copas porque, desde que conheceu uma tal Alice, gosta de gritar a toda a gente «cortem-lhe a cabeça, cortem-lhe a cabeça...». Tiveste azar com estes, mas vais ouvir muitas inconveniências dos restantes se te decidires a continuar o jogo.
- Mas qual é a razão para tanto mau humor? - retornou o homem.
- Mas que raio de resposta é essa? - ralhou o homem.
- É o problema de muita gente. Chateia-se por tudo e por nada - rematou o jóquer com uma gargalhada. - Olha, com os naipes é igual. Os de oiros lamentam a fortuna perdida, há muitas gerações, quando tiveram de abandonar os seus palácios e arranjar emprego. Os de espadas porque se acabaram os tempos da cavalaria e tiveram que depor as armas - as que eles usam agora são só para enfeitar. Os de paus sempre foram arruaceiros, gente de baixa estirpe, armados em nobreza. E os de copas, perdeu-os o vinho. Viste o nariz avermelhado da rainha? Está sempre com a pinga, não reparaste?
- Ai, ai, ai a nossa vida! - suspirou o homem. - Mas está tudo maluco ou quê? Eu quero lá saber dos problemas de família desses idiotas. São cartas. Têm de estar caladinhos e deixar-me jogar.
- Pois, mas não vais ter sorte nenhuma - riu-se o jóquer. - Sorte, está a ver o trocadilho? Sorte...
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