sábado, 3 de abril de 2021

Rimance da pomba cansada

 

(À minha amiga Teresa Pombo)

Lamentava-se uma pomba
No ramo de um pinheiro:
- Estou cansada, tão cansada,
De trabalhar o dia inteiro.

Não me falta que fazer
Nem a labuta se fina,
Desde que o sol se ergue
Até que no mar declina.

E mesmo sem o astro-rei
Para iluminar a lida,
O trabalho não acaba
Nem se muda a minha vida.

Noite dentro, mais trabalho,
Até romper a madrugada.
Aqui fica o meu protesto:
Estou cansada, muito cansada.

É trabalho e mais trabalho,
Já não sei dizer que não.
Dia a dia se agiganta,
Só pode ser maldição,

Já mal durmo, já mal como,
Meus olhos são duas brasas,
Tenho as costas alquebradas
Nem consigo dar às asas.

Mas, assim, pobre de mim,
Tão exausta que não aguento,
Ou ponho os pontos nos ii
Ou qualquer dia rebento.

Por isso, amigos meus,
Já chega de aflição.
Hoje é dia de aleluia,
É tempo de renovação.

Pousada neste raminho
Onde edifiquei o meu lar,
Vou esquecer o trabalho
E, finalmente, folgar.

sexta-feira, 2 de abril de 2021

O almocreve das letras

(A propósito do Dia Internacional do Livro Infantil)

O chiar das rodas da carroça ecoa entre as fragas, entrecortado pelo resfolegar do pequeno cavalo que, penosamente, a puxa. A ladeira é íngreme e o piso irregular. O almocreve dormita, reclinado no banco, com as rédeas pousadas sobre os joelhos. Os olhos semicerrados mal vêm a poeira que se levanta na tarde quente.

À falta de estímulo, cansado da carga pesada, o animal abranda o passo e depois estaca, acordando o homem.

- Então, Marengo, que se passa? Estás cansado? - diz ele para o animal. - A jornada já vai longa, compreendo, mas temos de chegar antes do cair da noite.