quarta-feira, 28 de junho de 2017

O peido

A audiência estava ao rubro. A abertura do concerto estivera a cargo da banda de covers «Deep Purple Throat». Era agora a vez da tão ansiada actuação dos «Intestinal Scream», iniciadores do «Gut Metal Rock».
Quando o vocalista, maquilhado a rigor, entrou em cena, o público aplaudiu-o calorosamente.
Imóvel, no meio do palco, o cantor levantou os braços. Fez-se silêncio. Foi então que anunciou que iria fazer um statement.
O baterista rufou a percussão e fez tinir os pratos. O solista dedilhou um intrincado arpejo na guitarra eléctrica. E o baixista arrancou um longo mugido do seu instrumento.

A casa (des)assombrada




Tinha fama de assombrada. À noite, as pessoas passavam ao largo, receosas. Diziam que se viam, lá dentro, luzes estranhas e se ouviam ruídos tenebrosos.
Situada perto do caminho-de-ferro, estava rodeada por um denso matagal. A pátina do tempo fazia-a parecer, cada vez mais, soturna e decadente. Não obstante, as paredes e o telhado continuavam íntegros e firmes.
Dizia-se que pertencera a uma família distinta a quem um acidente trágico dera sumiço. No entanto, não havia quem se lembrasse do nome deles, quem eram ou o que faziam.

terça-feira, 27 de junho de 2017

No bosque de Pã


Os eventos daquela manhã prenunciavam mais um dia miserável. Para começar, o carro deu o berro à porta de casa. Resignado a tomar o autocarro, percorreu a contragosto o caminho até à paragem mais próxima. Não chegou a tempo e o seguinte só passaria daí a uma hora, tarde demais Para piorar, começou a cair uma chuva miudinha, insistente. Não trouxera guarda-chuva e sentia a humidade a repassar-lhe os ossos.
Decidiu meter os pés ao caminho e tomar um atalho através do parque. A terra amolecida cedia debaixo dos sapatos, conforme se ia embrenhando entre as árvores. Entregue a si própria, aquela massa vegetal era mais um bosque selvagem que um parque. Mas isso não o preocupava, era território conhecido. Por ali, ganharia, pelo menos, meia hora. Talvez conseguisse chegar a tempo.