terça-feira, 24 de março de 2020

A falta de paciência do jogo das paciências (2)


Mais calmo, o homem voltou a sentar-se em frente às cartas. Hesitante, decidiu continuar o jogo das paciências. Mas, pelo sim pelo não, ignorou a primeira pilha e virou a carta no topo da segunda.
- Quem foi que teve a ousadia de me incomodar? - gritou uma voz feminina em tom autoritário - Cortem-lhe a cabeça, já!
Desta vez, o homem ia tendo um colapso. Quem falara fora a rainha de copas, que ele tinha acabado de virar. Afinal, era verdade. As cartas estavam vivas. E falavam...

- Perdão, vossa alteza - ouviu-se o homem dizer. - Só queria jogar às paciências, para passar o tempo. Estou fechado aqui há tanto tempo, que morro de tédio.
- Que impertinência a tua! - gritou a rainha de copas. - E achas que, por estares entediado, tens o direito de nos incomodar?
- É para isso que servem as cartas... Quando há outros parceiros, jogam-se umas partidas de sueca ou de bisca lambida. Quando se está sozinho, joga-se às paciências.
- Às paciências, é? Pois, acabou-se a paciência! - gritou estridentemente a rainha de copas. - Cortem-lhe a cabeça, cortem-lhe a cabeça...
O homem apressou-se a virar a carta para baixo, antes que ela repetisse o «cortem-lhe a cabeça».
Levantou-se de novo e de novo foi à janela, que escancarou completamente. Esticou a cabeça bem para fora e aspirou com força o ar frio da noite. Sentia-se a enlouquecer!

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