sexta-feira, 21 de novembro de 2008

A salsicha albina


Uma salsicha comum vivia amargurada com o estranho facto de sofrer de albinismo. Enquanto as suas irmãs exibiam uma tez digna dos efeitos de um Verão soalheiro, ela, por sua vez, era pálida e mirrada como um espargo desidratado. Já tinha tentado de tudo, mas não havia processo de bronzeamento - natural ou artificial - que lhe pudesse valer. Albina nascera, albina haveria de fenecer.
As outras salsichas, embora não se aproveitassem do facto para abusar dela, não conseguiam passar sem, ocasionalmente, fazer alguns comentários jocosos. O que irritava ainda mais a albina, que achava a atitude das irmãs de uma condescendência insuportável.
Se por frustração ou por inveja, não se sabe. O que é certo é que o deslavado enchido acabou por se tornar no manda-chuva da salsicharia. E, durante anos, vem cozinhando acordos e apoios para se manter no poleiro, hipotecando a sua consciência junto da clique carnívora que vive à custa do sangue, do suor e das lágrimas das suas irmãs.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

O anúncio


Tudo quanto é profissional da «calhandrice» nacional estava a postos para o anúncio.
A reunião dos carnívoros continuava para lá da hora anunciada e só após o seu termo a comunicação teria lugar. Até as moscas se impacientavam nos cafés, zumbindo, neuróticas, acima das melenas dos clientes. E o raio do anúncio que nunca mais vinha…
Nas cantinas, bares e restaurantes da populaça ou nos esconsos das cozinhas domésticas faziam-se vaticínios e apostas. A velha truta cínica e dura seria refogada em molho de vinho branco… Não, diziam alguns, seria assada ao natural ou frita em azeite virgem. Seria estufada ou cozida, apostavam outros.
Embora com opiniões tão diversas sobre a metodologia a adoptar, muita gente achava possível um «happy end» culinário que desse fim à prosápia de tão incómodo ser.
Engano deles. Quando, finalmente, o anúncio chegou, todas as expectativas caíram por terra. Nem refogada, nem assada, nem frita, nem estufada, nem cozida. A velha truta cínica e dura ia continuar a dar à barbatana no tal riacho de montanha onde era rainha e senhora.
Pois é, esqueciam-se que os carnívoros são obstinados e calculistas e apreciam outras iguarias: preferem ferrar a dentuça no pescoço dos animais de sangue quente.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A truta anarquista que chegou a ministra


Qual Nemo, qual Pi? O peixe mais famoso deste jardim à beira mar plantado não dá à barbatana nas águas do oceano, mas num modesto córrego de montanha. É uma velha truta, cínica e dura, que governa uma boa parte dos espécimes piscícolas do dito riacho. Segundo uma versão veiculada por certas más-línguas (de bacalhau), a dita criatura militou, em jovem, nas minguadas hostes que vão mantendo acesa a chama do ideal libertário. No entanto, depois de um longo e tortuoso percurso, em que a sua ascensão académica foi inversamente proporcional à coerência ideológica, a dita truta acabou por se render ao doce fascínio do poder, aceitando um cargo ministerial. Constituiu uma trupe de ajudantes reverentes e acéfalos, entregando o comando intermédio a dois carapaus de corrida manhosos. E assim ficou a velha a mandar nos seus iguais, que passou a tratar com a desfaçatez e sobranceria próprias de quem ascende a tão altos cargos.
Ora, a dita cuja teve uma autêntica epifania quando tropeçou num obscuro manual de culinária dos tempos da «outra senhora». Depois de ler e reler as bolorentas receitas, capazes de encher de colesterol maléfico as artérias de um asceta vegetariano, a agora ministra decidiu do tratamento a dar aos outros peixes seus subordinados para poderem circular no tal riacho de montanha. Primeiro, dividiu-os em dois cardumes diferenciados. Uns seriam peixes-titulares, os outros apenas peixes-peixes. Os primeiros mandariam nos segundos e os segundos obedeceriam aos primeiros. Para além disso, seriam todos, sem excepção, sujeitos a um processo culinário complexo e burocrático em que o principal procedimento raiava a mais perversa crueldade: seriam, entre outras coisas, «grelhados» até à exaustão.
A princípio, as outras trutas, bogas, barbos, ruivacos e afins nem sabiam que pensar nem que dizer. Examinaram e dissecaram as arrevesadas directivas da truta e seus carapaus de estimação e chegaram à triste conclusão de que esta, ao contrário dos discursos inflamados, não estava absolutamente nada interessada na melhoria da qualidade do seu desempenho natatório. O seu propósito era apenas o de poupar uns tostõezitos no orçamento do governo carnívoro de que fazia parte.
Os visados começaram por esboçar alguns protestos tímidos, que suscitaram um violento contra-ataque da velha truta cínica e dura. Intentou até virar contra estes a restante fauna aquática da região, embora com reduzido sucesso.
Até que, recorrendo ao seu direito à indignação, os condenados à que ficou conhecida como «tortura da grelha» decidiram manifestar-se publicamente.
Cem mil. É verdade. Cem mil trutas, bogas, barbos, ruivacos e afins inundaram as artérias do riacho num ruidoso protesto. Mas, por incrível que pareça, a velha não desarmou. Ela, na infalibilidade da sua imensa sabedoria, decidira que seriam «grelhados» e «regrelhados» e não havia retorno da decisão.
Veio o Verão, a migração sazonal, a desova e restantes etapas da proliferação das espécies exóticas e endémicas e a coisa acalmou um pouco. No Outono, no entanto, os sentenciados não baixaram os braços e voltaram a encher as artérias do riacho com os seus protestos. Desta vez, foram cento e vinte mil. É verdade. Cento e vinte mil trutas, bogas, barbos, ruivacos e afins.
Mas a velha continua na sua. De prepotência em prepotência, de mentira em mentira, os carapaus de corrida e respectiva mestra divertem-se a testar o que resta da paciência dos outros peixes. Daí que estes não terão outro remédio senão cerrar fileiras e correr com o trio até ao mar. Pode ser que um tubarão esfomeado tropece neles e os almoce. Que lhe façam bom proveito!

quarta-feira, 12 de março de 2008

O pepino mentiroso



No quintal das traseiras, havia um pouco de tudo: couves, alfaces, cenouras, nabos, feijões, tomates e outros legumes, incluindo uma batateira que ali nascera por engano. Mas o mais bizarro dos habitantes da horta era um pepineiro muito especial.
Enraizado debaixo de uma laranjeira, foi esticando a haste em direcção a um exuberante e perfumado roseiral, ao lado da casa, onde se situava a torneira de rega e havia mais luz. E, exactamente nessa extremidade, ostentava o único pepino da sua criação.
Com o tempo, o pepino foi engordando o corpo e a prosápia. Num ápice, tratou de dominar toda a horta, à custa das muitas artes e manhas que lhe surgiam não se sabe bem de onde. O seu principal argumento incluía um monumental paradoxo:
- Reparem bem: eu não sou um simples pepino. Reúno o melhor de dois mundos. Por via das raízes, ostento o delicado sabor das laranjas. E, por influência da vizinhança, exalo o perfume distinto das rosas. Se confiarem em mim, prometo que nada vos faltará e levarei a horta à prosperidade.
Os legumes deixaram-se levar, talvez por apatia, talvez porque não tivessem meios de desmentir a falácia. Mas, quando o dono da casa, ocupado com outros afazeres, descurou os cuidados da horta, o pepino aninhou o corpo rechonchudo na vala de rega e usurpou as poucas gotas que pingavam da torneira. Aos restantes, ordenou:
- Todos devem fazer sacrifícios. Se necessário, adubai a terra que vos deu vida, com os vossos corpos moribundos. O futuro da horta está em causa, bla-bla, bla-bla, bla-bla…
A coisa piorou com o tempo. Os legumes mirravam de sede e o descontentamento levou alguns à revolta:
- Um pepino que sabe a laranjas e cheira a rosas? Balelas! O tipo é mas é um ‘ganda’ mentiroso. Ele quer é usurpar os nossos direitos - dizia um.
Acicatada, toda a horta protestava:
- Deixa vir a água até nós. Não podemos aguentar mais sacrifícios.
E as couves, as alfaces, as cenouras, os nabos, os feijões, os tomates e outros legumes, incluindo a batateira que ali nascera por engano, gritavam em coro:
- Mentiroso, mentiroso. Mentiroso. Mentiroso.
Mas o pepino, colocado em posição estratégica, não abria mão dos seus privilégios.

Ora, como não há mal que sempre dure, nem bem que se não acabe, um dia, o dono da casa foi ao quintal, de sachola em punho. Entre outras coisas, tinha na intenção apanhar umas folhas de couve para fazer uma sopa. Mas deu-se conta que estava tudo a morrer de sede. No caminho, topou com o pepino, verde e viçoso, e levou-o. Depois, abriu a torneira e dessedentou a horta.
Com o produto da colheita, fez uma portentosa salada. Que se saiba, não sabia a laranjas, nem cheirava a rosas. Mas soube-lhe muito bem.
Do pepino mentiroso, sobraram apenas as cascas, que os coelhos roeram com grande satisfação.

segunda-feira, 10 de março de 2008

A convenção dos orégãos


Foi no maior sigilo que se realizou, no passado fim-de-semana, a convenção anual da Grande Loja do Orégão Dourado. O evento reuniu, num hotel da capital, todos os membros desta conhecida sociedade secreta, a que pertencem as mais destacadas individualidades da Nação, responsáveis da administração pública e outros notáveis.
Ao que conseguimos apurar, um dos objectivos desta iniciativa foi a escolha do Orégão Maior da organização, cargo disputado por três candidatos cuja identidade não foi revelada. No final, teve lugar uma refeição ritual, cujo menu era constituído principalmente por pratinhos de pipis, iscas com elas e caracóis.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

A morcela viajante



Uma morcela de arroz decidiu ir correr mundo. Andou, andou, até que chegou à beira do oceano. Como não lhe apeteceu voltar para trás, deitou-se à água e pôs-se a navegar pelo mar dentro. Pouco depois, uma gaivota que andava à pesca deu com a morcela vogando nas ondas e pensou logo que tinha ali um belo almoço. Abriu o bico e mergulhou das alturas em direcção à água. A morcela viu as manobras da gaivota, mas não perdeu o sangue frio. Quando o passaroco estava quase a filá-la, a morcela desviou-se com um golpe de rins. A gaivota bateu de chapa na água e perdeu os sentidos. Um safio que ia a passar admirou-se da coragem da morcela e pediu-a logo, logo, em casamento. Mas a morcela não aceitou. Agradeceu polidamente, retorquindo:
- Obrigada, meu bom amigo, mas não. Acredito que tenhas boas intenções. Mas eu sou uma morcela emancipada e não tenho nos meus projectos mudar fraldas borradas e apaparicar calaceiros. O meu destino é correr mundo. E é o que vou fazer.
E foi.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

A vingança do guardanapo


Um guardanapo alvo e engomado foi admitido como agente da Guarda. O comandante do posto, um esfregão grosseiro e insolente, achava que o guardanapo era demasiado fino para o exercício daquelas funções e estava sempre a implicar com ele.
- Olhe lá, você não será antes um guarda-nabo? Isto aqui é para gajos de barba rija. E quando as coisas não vão a bem, vão mesmo à bruta. Como é que você, um engomadinho do caraças, vai fazer valer a sua autoridade, se nem pêlo tem na venta, hã?
O pobre guardanapo ficava humilhadíssimo com estes comentários boçais, mas engolia em seco e permanecia em silêncio. É que ele, quando se enervava, gaguejava descontroladamente. E imaginava o vexame que passaria se descobrissem nele aquilo que seria considerado como mais uma fraqueza.
Foi ouvindo, foi engolindo, foi enchendo, mas aguentava-se estoicamente, fingindo que fazia orelhas moucas às provocações do sargento esfregão… embora, por dentro, ficasse a ferver.
Numa tarde de pouco movimento - estava o posto cheio de agentes - ao ouvir mais uma série de ordinarices do comandante, não aguentou mais e rebentou.
- Vá-vá-á lim-lim-limpar la-latrinas, seu-seu la-lateiro.
Atirou o bivaque para cima do balcão de atendimento e saiu porta fora. O resto da corporação ria perdidamente.
- Ó pá! O gajo não é só engomadinho, também é gago - dizia um escovilhão lambe-botas.
- Pois. É um engo-gugu-mamadinho - respondeu outro.
- Eu é que tinha razão. É um verdadeiro guarda-nabo - rematou o comandante.
Mas cá se fazem, cá se pagam! Quando o esfregão chegou a casa, ao fim do dia, ia tendo um chilique. A mulher, uma bela toalha de bilros, tinha feito as malas e fugira para o Brasil com o guardanapo.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

O «croissant» solitário


Um «croissant» simples vivia só, num apartamento dos subúrbios de uma grande cidade. As noites passava-as ele bem, porque trabalhava numa padaria e o odor do pão acabado de cozer fazia-o esquecer todas as suas mágoas. O pior era de dia, quando voltava para casa e se confrontava com a sua solidão.
Um dia, pôs um anúncio no jornal, propalando o seu desejo de arranjar uma companheira.
Responderam duas candidatas: uma elegante fatia de queijo e uma saudável e vigorosa fatia de presunto. Se uma reunia o requinte e a sofisticação próprias das damas da alta sociedade, a outra tinha todo o encanto das gentes enérgicas do campo.
Depois de um tempo de indecisão, acabou por ficar com as duas, a dama e a camponesa. Vivem os três em alegre harmonia, numa vivenda de Cascais que o «croissant», agora misto, recebeu de herança.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Os três candidatos laranja


Numa rua de Pombal, três gomos de laranja discutiam entre si qual deles tinha o perfil mais adequado para deputado da Nação.
O primeiro argumentava com os seus doutos conhecimentos das complexas regras do ténis de mesa. O segundo, equilibrado perigosamente em cima de um postal dos correios, falava das suas viagens por terras distantes e do seu domínio das grafias estrangeiras.
O terceiro barafustava com os outros dois dizendo que sempre tinha sido o mais inteligente dos três e não admitia sequer que pusessem em causa aquilo que para ele era evidente: o deputado seria ele mesmo, sem mais argumentos nem palavreados ocos.
Um rapazinho que vinha a correr pela rua abaixo espantou-se com aquela algaraviada. Parou, olhou para eles, pegou num de cada vez e comeu-os, que muito bem lhe souberam.
E assim perdeu a Nação três dos seus melhores candidatos a deputados. Mas, até hoje, ainda ninguém reparou.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

A ervilha capitalista


Toda a gente se lembra da famosa princesa que afirmou a pureza da sua estirpe ao dar-se por incomodada com uma ervilha que estava muito quieta e calada debaixo de uma caterva de colchões, edredões, travesseiros, mantas, cobertores e outros agasalhos sobre os quais dormira (coitado do príncipe que casou com ela; com uma tipa tão comichosa, deve ter passado as passas do Algarve…). O que ninguém se perguntou ainda, foi: «Então e a ervilha? A ervilha não é gente? Que foi que lhe aconteceu?» É exactamente o percurso dessa ilustre leguminosa que aqui vamos tentar desvendar.
Depois de constatar que a dita não fazia parte das jóias reais nem estava num museu (conforme sugerem as crónicas da época), iniciámos uma intensa investigação que nos conduziu aos baixos do palácio. É que é normalmente aí que se situa a cozinha.
A opinião do cozinheiro foi de que a ervilha, para provocar tanto chinfrim, já não estava em estado de ser cozinhada. Era, de certeza, uma ervilha seca, boa para a sementeira. E o melhor seria perguntar ao hortelão real se ouvira falar dela. Mas o hortelão não soube adiantar mais nada. Pelo que decidimos dar outro rumo à investigação.
Deixámos o palácio atrás das brumas da fantasia e dirigimo-nos ao mundo real. O do capitalismo selvagem, da pobreza endémica e da violência gratuita. Foi aí que a encontrámos. Desgostosa com a pouca importância que tivera na história - embora reconhecesse a Hans Christian Andersen «uma grande capacidade efabulatória» - a ervilha tinha batido com a porta para fazer pela vida noutras paragens. Entre outras coisas, fez parte de um «gang» mafioso, onde estava encarregue das torturas, mas as suas pretensas vítimas não tinham a sensibilidade cutânea da princesa da história. Tentou ainda a carreira militar, mas o máximo que conseguira realizar fora um «galo» na tola rapada de um recruta desmiolado, ao ser projectada por outro recruta desmiolado. Acabara por se tornar empresária do ramo alimentar.
Estava nesse momento a tratar da «deslocalização» de uma das suas fábricas para um país de Leste. Perguntámos o que ia acontecer aos 324 trabalhadores que essa decisão lançava para o desemprego. «É um mundo cão - desabafou - mas o que havemos de fazer?» E voltou-nos as costas, dizendo: «O capitalismo não tem pátria».
Pois é! Mas, à conta disso, são sempre os mesmos que pagam as favas!

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

A tartaruga amnésica

Na longínqua e misteriosa China, andava uma velhinha vasculhando os rochedos da maré baixa à procura de algo para comer quando encontrou uma pequena tartaruga marinha. «Que bela sopa vou eu fazer com esta tartaruga» pensou; pegou nela e levou-a para casa.
A tartaruga, que embora pequena era ainda mais velha que a velhinha, não teve outro remédio senão conformar-se com a sua pouca sorte. Já tinha percorrido tantas milhas ao longo dos oceanos do mundo, já tinha deixado os seus ovos em tantas praias arenosas, que se dava por satisfeita com a vida que tinha tido.
Chegada a casa, a velhinha colocou a tartaruga sobre a mesa da cozinha e foi apanhar umas ervas aromáticas para a sopa. A tartaruga, assim que se sentiu imóvel, deitou a cabeça de fora da carapaça e viu que estava sozinha. Estendeu as barbatanas e tentou descer da mesa. Mas, como não reunia as competências físicas para o fazer, deu um enorme trambolhão, bateu com a cabeça e perdeu os sentidos. Quando voltou a si, tinha perdido todas as referências sobre a sua identidade e experiência passada. Estava amnésica.
Por uma estranha associação de ideias, a tartaruga amnésica convenceu-se que era um cão. Quando a velhinha voltou, encontrou-a no chão, a latir, correndo atrás do rabo.
A encarquilhada chinesinha não ganhou para o susto. Mas, passada a perplexidade inicial, pensou para os seus botões: «Se os deuses fizeram chegar a mim esta extraordinária criatura, decerto não foi para que eu fizesse dela uma sopa. Devem ter-se apiedado da minha solidão e enviaram-me uma companhia para me alegrar até ao fim dos meus dias».
E foi assim que a tartaruga passou de projecto gastronómico a animal de companhia. Daí aquele provérbio chinês que diz: «Nem só os cães ladram: as cadelas também; e por vezes as tartarugas».

domingo, 3 de fevereiro de 2008

O mandato do peixe pré-histórico

Há várias maneiras de confirmar a frescura de um peixe. O brilho dos olhos, a vermelhidão das guelras, a rigidez das carnes, a integridade das escamas e o próprio odor são apenas alguns sinais. Mesmo conservado à força de gelo e sal, mesmo escamado e estripado, vê-se logo se um peixe é ou não fresco.
Mas há um peixe que, mesmo vivo e a dar à barbatana, é mais retrasado que um espécime congelado no tempo em que se inventou o primeiro frigorífico. É o peixe pré-histórico, que cruza as profundezas dos mares desde há milhões de anos. É tão antigo que, ainda os dinossauros não existiam, já ele abanava a cauda no caldo primordial. Não se sabe por que capricho da natureza, mesmo depois dos grandes lagartos se terem transformado em curiosidades de pedra, ainda o peixe pré-histórico continua a percorrer os oceanos, com o seu ar sisudo e carrancudo.
Ora, certo peixe pré-histórico foi um dia convidado por um cardume de peixitos para se candidatar a uma autarquia das profundezas. A princípio, mostrou-se relutante, mas acabou por sucumbir ao discurso melífluo dos peixitos: que era preciso destronar o bacalhau que então os chefiava, que era preciso abrir espaço à livre iniciativa, que era preciso isto, que era preciso aquilo… E aquele que tinha melhores condições para o fazer era ele, pois então. Mesmo que fosse feio que nem uma alforreca, mesmo que se portasse à mesa como um carroceiro, mesmo que não ousasse alinhavar quatro palavras sem cometer um atentado à inteligência, isso eram pormenores sem importância.
O que é certo é que aceitou o repto e ganhou por uma unha negra. Embora a prazo, tornou-se o líder supremo de todos os cardumes das redondezas.
Mas depressa o escamudo pré-histórico achou que autarquia rimava bem com autocracia. Eram ambas a mesma coisa. Ou não? Claro que sim. Não?
Quem tinha a ousadia de o desdizer levava logo no toutiço: começou de imediato a devorar os opositores e os possíveis concorrentes ao cargo. É que afinal era carnívoro e ninguém sabia.
Os peixitos puseram as barbatanas à cabeça, imaginando que teriam de suportar o labrego durante mais um milhão de anos. Tinham-na feito bonita. E agora?
A primeira ideia foi armar-lhe uma cilada e fazer com que fosse parar ao prato de algum «gourmet». Mas a profundidade a que se movimentava deixava-o a salvo das redes pesqueiras. Por isso é que tinha vivido tanto tempo…
Decidiram apoiar outros candidatos, tentando derrotá-lo nas eleições. Mas estes ou eram devorados antes do acto cívico, ou ninguém votava neles, com medo de ser devorado também.
Decidiram acusá-lo de corrupção, para o forçar a perder o mandato. Mas também não deu resultado…
A sorte, às vezes, surge quando menos se espera. Afinal o peixe pré-histórico acabou por abandonar o poder por causas naturais. Como era muito velho, não aguentava dietas ricas em proteínas, teve uma indigestão e morreu.
No funeral, os peixitos fingiram uma tristeza que não sentiam e lá mandaram o cadáver do odiado líder para o abismo dos notáveis.
Mas há gente que nunca ganha juízo: no dia seguinte, trataram de se reunir para escolher um novo candidato. E a discussão em que se envolveram era se deviam apoiar o bacalhau ou convidar um tubarão.

sábado, 19 de janeiro de 2008

A «manif» da castanha pilada

(Ao Zé Oliveira)

Uma castanha pilada estava a espreitar pelo Buraco da Fechadura, quando ouviu uma coisa que a deixou alarmada:
- Amanhã vamos organizar um magusto para a malta lá do serviço. Temos de ir comprar as castanhas e a água-pé ainda hoje.
Eram os vizinhos da frente, que andavam sempre em farras e algazarras.
- Mau, Maria! - sobressaltou-se a castanha pilada. - Vai haver carnificina. O que me safa é eu ser uma castanha pilada. Assim ninguém me lança ao fogo. O pior são as pobres das primas, que vão esturricar na fogueira para estes alarves encherem a barriga. Vou ter de fazer alguma coisa!
Decidiu-se então a mandar um e-mail à SPC, isto é, à Sociedade Protectora das Castanhas, a fim de promover uma manifestação de protesto contra o tal magusto.
Juntaram-se os manifestantes no local anunciado e armaram o arraial com a parafernália do costume: altifalantes, bandeiras, faixas, pancartas e outros materiais de agit-prop.
À hora marcada, no entanto, não apareceu ninguém: nem os vizinhos da frente, nem a malta lá do serviço. E do magusto, nicles.
Foi-se a saber e a iniciativa tinha sido cancelada devido à falta de fundos. Ao preço a que estava a castanha, não havia carcanhol que chegasse. Quanto à água-pé, sem castanhas, também não valia a pena.
E os manifestantes voltaram para casa cabisbaixos, remoendo impropérios contra a sua falta de sorte. É o que faz a carestia de vida!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

O piquenique da bolacha Maria

No primeiro dia de Primavera, uma turma de bolachas Maria de um colégio interno saiu para fazer um piquenique à beira-rio. A meio da tarde, lá foram elas com os cestos da merenda, à procura de um local onde pudessem estender as toalhas e desfrutar o sol primaveril. Atrás ia a irmã Celeste, uma barriga de freira lustrosa e rechonchuda, encarregada de as vigiar.
As bolachas, no entanto, não se ralavam muito com isso. Sabiam bem como ludibriar a sua guardiã, de modo a poderem fazer todas as traquinices que lhes apetecessem. Chegadas ao local do piquenique, empanturraram a irmã Celeste com guloseimas, até que esta, embalada pelo zumbir das abelhas, acabou por adormecer.
Sorrateiras, as bolachas descalçaram os sapatos e as meias, despiram as saias e as blusas e puseram-se a chapinhar no rio. Mas, passado algum tempo, a algazarra era tamanha que a irmã Celeste acordou sobressaltada.
Zangada com a impertinência das pequenas, obrigou-as a sair da água e a vestirem-se imediatamente. Depois, voltaram para o colégio a toque de caixa.
Para castigo, nessa noite foram para a cama sem jantar. E nunca mais houve passeios, nem piqueniques, nem festas. Passaram a viver em regime de austeridade, como as bolachas de água e sal.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

As trufas siamesas

Separadas à nascença com precisão cirúrgica pelo pasteleiro, duas trufas siamesas nunca se libertaram da sensação de serem um corpo só. De tal forma, que nunca estava uma sem a outra. A identificação era tão grande que confundiam as suas próprias identidades.
- Desculpa lá, esta sou eu ou és tu? - era costume perguntarem.
E por vezes o debate alargava-se por longos períodos, até chegarem a um acordo sobre quem era quem.
A paixão assolapada que cada uma delas tinha pela outra era motivo de risota, dando azo a histórias dignas de antologia. Na pastelaria, toda a gente as conhecia pelas «fufas siamesas», embora, em rigor, não fossem nem uma coisa nem outra.
- Desculpa lá, eu sou uma trufa ou uma fufa? - gargalhava um pastel de nata, num tique efeminado.
- Não. És um pastel de nata sem vergonha. - respondia, perdida de riso, uma fatia de torta, que era torta.
Fartas de serem postas a ridículo, as trufas estavam determinadas a desfazer o equívoco. Um dia, quando menos se esperava, decidiram seduzir um jovem alto, espadaúdo, loiro e de olhos azuis que entrou na pastelaria. O rapaz não resistiu aos encantos das trufas e, perante a estupefacção da doçaria, comeu as duas ao mesmo tempo.

sábado, 12 de janeiro de 2008

O strip-tease da cebola

Crivada de dívidas, uma cebola desempregada não teve outro remédio senão aceitar um trabalho de stripper num night-club de terceira categoria.
Nessa noite, a cebola estava nervosíssima, já que era a primeira vez que se iria expor assim aos olhares de gente estranha. Mas lá subiu ao palco e começou a descascar-se. Conforme iam caindo as peças do vestuário da cebola, a clientela ululante gritava «tira, tira», cada vez com mais entusiasmo. E a pobre cebola lá se ia descascando a contragosto.
O problema é que, com tanta roupa, nunca mais chegava ao que interessa. E depois havia aquele estranho odor corporal que ia libertando…
Horas depois, os clientes, frustrados e lavados em lágrimas, iniciaram um motim e destruíram todo o mobiliário do night-club.
O patrão despediu a cebola imediatamente e pô-la no olho da rua sem lhe dar um tostão.
Mas a cebola não ficou desempregada, não. Um agente de espectáculos, que assistira a tudo, arranjou-lhe emprego como actriz num dramalhão de fazer chorar as pedras da calçada.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

O dilema dos papa-açorda

Decretou-se o luto na congregação: finara-se a tachada de cozido à portuguesa que mobilizara tantas devoções palatinas. Grande foi a consternação dos acólitos, grande a choradeira pelas vielas do burgo.
Reuniram-se em conselho gastronómico os maiorais do culto, a fim de escolher sucessor. Mas, seis horas depois, ainda se não chegara a consenso.
A especulação incendiava os noticiários televisivos, transbordava das colunas dos jornais e monopolizava as conversas de café. A que se deveria tal impasse? Porque sim, porque não, porque talvez - arriscavam uns e outros.
Finalmente, depois de acesas discussões, dos embates entre as diversas facções, de difíceis e aturadas negociações, do fogão em que os maiorais haviam acabado de preparar uma especialidade culinária, saiu o tão esperado fumo branco. E alguém constatou: temos papa! A escolha havia sido unânime: um borbulhante e cheiroso tacho de açorda ocupava agora o centro das atenções.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O bife do lombo supersticioso

Fosse qual fosse a ocorrência, desde que saísse da rotina habitual, era sempre tomada como um sinal fatídico por um certo bife do lombo. É que ele era muito, mas mesmo muito supersticioso.
Se lhe passasse um gato preto pela frente, era certo que se benzeria sete vezes e sete vezes invocaria a protecção dos bons espíritos contra a desgraça que ameaçava cair-lhe em cima. Mas o mesmo aconteceria se o gato fosse cinzento, branco, amarelo ou malhado, tão supersticioso era este bife do lombo.
A sua vida era cheia de complexos rituais, rezas, invocações, promessas, peregrinações e outras manias e aberrações, tanto se encarniçava na luta contra o azar.
E assim queimou os seus melhores anos. Não casou, não teve filhos, não plantou nenhuma árvore, nem escreveu nenhum livro. Acabou, como muitos outros bifes do lombo, rilhado por um conviva voraz, numa boda de casamento.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

O croquete que ganhou a Volta a Portugal

Um croquete apaixonou-se perdidamente por uma bela batata frita, alta, loura e bronzeada, e decidiu pedir-lhe namoro. Mas a batata frita era adepta do sexo alternativo e optara por estabelecer relações apenas com outras batatas fritas iguais a ela.
Com o desgosto, o croquete pensou em mil e uma maneiras de pôr termo à vida. Até que decidiu ir fazer parapente lançando-se do Sítio da Nazaré …mas sem o parapente. Pegou na sua bicicleta e pedalou furiosamente em direcção àquela famosa estância balnear.
A certa altura, o croquete vislumbrou uma chusma de ciclistas que o perseguiam a alta velocidade. Assustado, pedalou ainda mais energicamente, tentando escapar-se àquilo que ele pensava ser uma acção punitiva de um bando rival.
Tanto se empenhou a fazer girar a roda pedaleira, que cortou a meta da Volta a Portugal em primeiro e ganhou a camisola amarela. E descobriu que os seus supostos perseguidores eram, afinal, os restantes concorrentes à Volta.
Hoje, o afortunado croquete dedica-se ao ciclismo, com o patrocínio de uma conhecida marca de produtos alimentares. E é alvo das atenções das mais desejadas batatas fritas.

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

A panela de sopa que chegou a secretária de estado

Aquando da constituição do novo governo, uma panela de sopa pegou no cartão do partido e foi pedir satisfações ao primeiro-ministro recém-eleito: que sempre tinha sido uma militante dedicada, que se fartara de colar cartazes, de distribuir panfletos e autocolantes e até gastara o seu latim a tentar convencer os eleitores da rectidão do programa eleitoral. E o resultado estava à vista: maioria absoluta! Decerto que ela merecia um lugarzinho no novo governo.
- Uma panela de sopa? Mas a senhora não se enxerga? Ainda se fosse um tacho… Ora esta! - retorquiu o primeiro-ministro.
Mas a panela de sopa não se deixou intimidar e respondeu-lhe:
- Não se abespinhe, que não vale a pena. Sou uma mera panela de sopa, mas já matei a fome a muita gente.
E o primeiro-ministro teve que se render às evidências, nomeando a panela de sopa para Secretária de Estado da Alimentação.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Morte trágica de um rabanete asmático

Havia um rabanete que sofria de asma. O pobre legume não podia fazer esforços mais pesados ou ficava logo com falta de ar e a tossir desesperadamente. Não podia andar de bicicleta, carregar pesos, subir escadas, engraxar os sapatos… Resumindo, tinha um sem número de limitações que lhe tornavam a vida muito penosa.
Depois de vários dias ao relento nas filas do posto médico, lá conseguiu uma consulta onde lhe receitaram uma bomba para asmáticos, o que lhe permitiu melhorar substancialmente a sua qualidade de vida.
Tudo corria agora muito melhor ao rabanete, dado que conseguia controlar a asma e podia assim desempenhar algumas tarefas que até aí lhe estavam vedadas.
Ora, aconteceu que um dia se esqueceu da bomba no autocarro que o trazia do trabalho. Quando se lembrou, já o veículo ia em andamento. O rabanete enervou-se, pôs-se a correr atrás do autocarro aos gritos e acabou por desmaiar com falta de ar. E o pior aconteceu quando um condutor apressado lhe passou por cima e o reduziu a puré.
Enfim, uma tragédia!

domingo, 6 de janeiro de 2008

O doutoramento do torresmo

Concluiu o seu doutoramento, por unanimidade e aclamação, na Universidade Independente, um naco de toucinho de Chaves. A tese, considerada pioneira no nosso país, versa a temática da salinização do presunto curado e o contributo das folhas de louro para a caracterização dos sabores nortenhos.
O naco de toucinho foi levado em ombros pelos seus pares e promovido a torresmo pelo processo tradicional, num tacho de barro adequado a esse fim. Diz quem teve o privilégio de assistir ao evento que os odores libertados eram de fazer crescer água na boca.

sábado, 5 de janeiro de 2008

Revolta na salada de mexilhões

Nem tudo corre bem na salada de mexilhões. Tal como noutros sistemas fechados, também aqui há quem se demarque da linha oficial e se arrogue o direito de manifestar opinião diversa. Foi o que aconteceu a uma rodela de cebola, que criou um movimento dissidente clandestino com o objectivo de protestar contra o actual estado de coisas.
Durante uma manifestação não autorizada, foram feitas várias prisões e dos detidos nunca mais se soube nada. O que leva as organizações humanitárias a acusar as autoridades locais de ter eliminado fisicamente os oposicionistas. Os protestos chegaram mesmo às Nações Unidas, mas as entidades oficiais negam qualquer responsabilidade.
O que é certo é que os inspectores da ASAE, da última vez que inspeccionaram a salada de mexilhões, notaram que as coisas já não cheiravam nada bem.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

O gaspacho que foi eleito papa

Sobre um país distante, abateu-se uma violenta seca que desertificou os campos e deixou a população quase sem nada para comer.
Houve um dia que restavam apenas cinco tomates maduros, um pimento verde, um pepino, uma cebola, quatro dentes de alho, uma pitada de sal, um restinho de azeite, uma pinga de vinagre de vinho, um molhinho de orégãos e três fatias de pão de véspera.
Reunido o Conselho de Estado, foi decido juntar tudo e fazer um gaspacho, porque já não havia dinheiro para o gás, o que permitiria fazer uma sopa quente. O gaspacho foi então distribuído à população faminta que o saboreou deliciada. Houve até quem lambesse a terrina.
Fez-se depois um concurso onde se decidiu canonizar tão sublime iguaria, que havia salvo o povo da inanição. E foi assim que, naquele país, o gaspacho foi eleito a melhor papa de sempre.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

A patanisca que queria ingressar na função pública

Farta do cheiro a fritos da tasca onde nascera, uma patanisca de bacalhau decidiu ingressar na função pública.
Procurou no jornal da terra se havia vagas nalguma repartição e, depois de identificar duas ou três hipóteses, preparou-se para concorrer a um lugar de topógrafo municipal.
Elaborou um imenso currículo com todas as suas habilitações e realizações profissionais, a que juntou fotocópias dos respectivos certificados. Explicou ainda que sabia muito bem o que era um teodolito. Aliás, que tinha mesmo sido noiva de um, mas que este batera a asa para a ilha da Madeira e nunca mais voltara, o infame. Que, no entanto, não guardava ressentimento e estava disposta a esquecer o incidente.
Quase no final do prazo do concurso, meteu-se na longa fila que dava a volta ao quarteirão e esperou a sua vez. Conseguiu entregar a sua candidatura quando o guiché estava quase a fechar.
Mas de nada lhe valeu. A Câmara contratou o teodolito, que entretanto havia voltado das ilhas. É que este sempre era da terra e trazia uma carta de recomendação do Governo Regional.

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

A colher de pau refractária

Uma colher de pau foi apurada para a tropa. Uma semana antes da data em que tinha de se apresentar à recruta, fez a trouxa e pôs-se a caminho do quartel de Mafra. E lá foi aos saltinhos num só pé, que é o que fazem todas as colheres de pau quando têm de se deslocar pelos seus próprios meios.
Passou o primeiro dia e não havia meio de lá chegar. Passou o segundo dia e não havia meio de lá chegar. Passou o terceiro dia e não havia meio de lá chegar. Passou o quarto dia e não havia meio de lá chegar. Ao quinto dia ainda ela estava demasiado longe do seu destino, mas suficientemente perto de casa para voltar para trás. E foi o que fez.
O que é estranho é que nunca deram pela sua falta. Uma colher de pau podia dar muito jeito na resolução de alguns dos mais graves conflitos mundiais!