Tinha
fama de assombrada. À noite, as pessoas passavam ao largo, receosas. Diziam que
se viam, lá dentro, luzes estranhas e se ouviam ruídos tenebrosos.
Situada
perto do caminho-de-ferro, estava rodeada por um denso matagal. A pátina do
tempo fazia-a parecer, cada vez mais, soturna e decadente. Não obstante, as
paredes e o telhado continuavam íntegros e firmes.
Dizia-se que pertencera a uma família distinta a quem um acidente trágico
dera sumiço. No entanto, não havia quem se lembrasse do nome deles, quem eram
ou o que faziam.
Numa manhã de Primavera, apeou-se do comboio um desconhecido. Tinha a barba
e o cabelo grisalhos e as roupas descuidadas. Ao ombro, uma mochila militar
dava-lhe um ar de velho combatente.
Deram por ele a rondar a casa, talvez em busca de um
lugar para pernoitar. Nessa noite, essas mesmas pessoas viram, de facto, luzes
estranhas lá dentro. E disseram ainda ter ouvido os tais «ruídos
tenebrosos» de que se falava.
No
dia seguinte, lá estava o desconhecido, a roçar o matagal em volta. As portadas das janelas estavam abertas e os vidros limpos.
Era
tema para falatório. Quem era aquele estranho e que direito tinha ele de se
apropriar de uma casa que não lhe pertencia?
Os
habitantes da vila decidiram confrontá-lo. Alguns exigiram a sua expulsão, nem
que fosse à força.
O
homem apareceu à porta, quando o ruído da multidão se aproximou. Disse-lhes que
se acalmassem. Exibiu uma escritura. A turba debandou.
Durante
mais uma semana, a casa continuou a perder o aspecto de abandono que tivera
durante tantos anos. Parecia agora que sempre fora habitada, cuidada, amada.
Numa
tarde de Sábado, o desconhecido trancou de novo portas e janelas e partiu no
último comboio.
A
casa ficaria agora desassombrada por uns tempos.
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