O bando reunia-se no descampado atrás da
escola. Pedro era o mais alto. Vítor, macilento e enfezado, era tido como muito
esperto. Por seu lado, Paulo era um fedelho manhoso, que viera de outro bairro.
O restante punhado de cachopos andava às ordens do trio.
Apesar de Pedro ser «o chefe», era Vítor
quem tomava as decisões mais importantes. Paulo, a quem uma parte dos elementos
do grupo obedecia directamente, não escondia os ciúmes…
Embora passassem a maior parte do tempo a
«reinar», a sua ocupação preferida era, nos intervalos e no final das aulas,
extorquir os restantes colegas. E não apenas os lanches. Dinheiro, roupas e
objectos de marca, tudo o que viesse à rede era peixe. Uns encontrões e umas
ameaças eram o suficiente para que as suas vítimas não dessem com a língua nos
dentes.
Num dia de Verão, já as aulas tinham terminado, depois de
umas braçadas no rio, decidiram ir jogar futebol. Pedro levava a bola que o avô
lhe oferecera pelos anos, mas como de costume, foi Vítor quem começou a formar as
equipas. Dessa vez, Pedro discordou das escolhas. Ele é que mandava e, ainda
para mais, a bola era sua. Depois de uma azeda troca de palavras, Vítor decidiu
desvincular-se do grupo. Pedro gritou-lhe:
- Se te vais embora, nunca mais voltas a andar connosco!
- Quero lá saber. Estou farto de te aturar. – disse Vítor, virando
as costas.
Paulo estava exultante. Sempre invejara a influência do
outro e agora tinha o caminho livre. Só que a sua alegria foi sol de pouca
dura. Pedro chamou uma loirita arrapazada, por quem andava embeiçado.
- A partir de hoje, és o meu braço direito. – disse-lhe. –
Escolhe tu.
Foi a gota de água. Sentindo-se preterido «por causa de uma
gaja», Paulo ameaçou ir-se também.
- Mau! Não vais nada embora. Tu é que pediste para entrar no
grupo. Só sais quando eu te deixar.
- Vou eu e vão os meus amigos!
- Isso é que era bom. Não vais tu nem vai ninguém. Eu é que
mando. Atrevam-se e vão ver como elas vos mordem… – berrou Pedro.
Mas Paulo e os colegas ignoraram-no e foram mesmo embora. A
pouco e pouco, os restantes garotos acabaram também por desmobilizar. Nem a
loirita ficou.
Amuado, Pedro sentou-se na bola, com a cara entre as mãos e
os cotovelos apoiados nos joelhos. Dizem até que chorou.
Pedro cresceu e acabou por se tornar o primeiro-ministro de
um belo país à beira-mar plantado. Numa certa tarde de Verão, pareceu-lhe, amargamente,
estar a reviver aquele episódio.