terça-feira, 15 de janeiro de 2008

As trufas siamesas

Separadas à nascença com precisão cirúrgica pelo pasteleiro, duas trufas siamesas nunca se libertaram da sensação de serem um corpo só. De tal forma, que nunca estava uma sem a outra. A identificação era tão grande que confundiam as suas próprias identidades.
- Desculpa lá, esta sou eu ou és tu? - era costume perguntarem.
E por vezes o debate alargava-se por longos períodos, até chegarem a um acordo sobre quem era quem.
A paixão assolapada que cada uma delas tinha pela outra era motivo de risota, dando azo a histórias dignas de antologia. Na pastelaria, toda a gente as conhecia pelas «fufas siamesas», embora, em rigor, não fossem nem uma coisa nem outra.
- Desculpa lá, eu sou uma trufa ou uma fufa? - gargalhava um pastel de nata, num tique efeminado.
- Não. És um pastel de nata sem vergonha. - respondia, perdida de riso, uma fatia de torta, que era torta.
Fartas de serem postas a ridículo, as trufas estavam determinadas a desfazer o equívoco. Um dia, quando menos se esperava, decidiram seduzir um jovem alto, espadaúdo, loiro e de olhos azuis que entrou na pastelaria. O rapaz não resistiu aos encantos das trufas e, perante a estupefacção da doçaria, comeu as duas ao mesmo tempo.

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