sexta-feira, 20 de março de 2020

O monstro minúsculo que queria ser rei


Versão ebook disponível no ISSUU

Num lugar muito longe daqui, havia um monstro minúsculo, tão pequeno, tão pequeno que ninguém conseguia vê-lo à vista desarmada. No entanto, tinha muito mau feitio e uma enorme ambição: tornar-se num gigante e ser rei absoluto. Como tinha nascido com uma coroa na cabeça, achava que tinha direito a dominar todo o planeta.
Um dia, foi consultar uma bruxa malvada muito poderosa e disse-lhe:
- Ouve lá, ó bruxa maléfica, estou decidido a tornar-me num gigante e a ser o rei absoluto deste planeta. Se me ajudares a consegui-lo, recompensar-te-ei e nomear-te-ei minha Primeira Conselheira.
A princípio, a bruxa achou que aquele monstro minúsculo não devia estar bom da cabeça. Ainda por cima, manifestava uma irritante falta de respeito. Chegou mesmo a pensar lançar-lhe um feitiço que o transformaria num sapo ou, como era tão pequeno, num grão de pó. Mas depois reconsiderou, pensando que aquilo até podia ser divertido e respondeu:
- Combinado! Se fizeres tudo o que eu disser, ajudo-te a conseguir o que pretendes.
Virou costas e foi para junto do seu caldeirão, criar um feitiço especial.
Passado algum tempo, a bruxa chamou o monstro minúsculo e disse-lhe:
- Já preparei um feitiço que te permitirá realizar o teu desejo. Mas, para isso, há algumas condições.
- Ai sim? - disse o monstro minúsculo - Que condições são essas?
- Primeiro, tens de prometer que farás tudo o que eu disser, como eu disser e quando eu disser.
- Está bem, prometo! - resmungou o monstro minúsculo, com maus modos.
A bruxa explicou então:
- Para poderes ser o rei do mundo, tens de subjugar os humanos, que são quem, neste momento, domina o planeta. Vais entrar dentro deles e submetê-los à tua vontade. No entanto, tens um tempo limitado para habitar o corpo de cada um, antes que te consigam expulsar.
- De acordo - disse o monstro minúsculo. - E que mais?
- Só podes ir de humano em humano quando eles estiverem em contacto entre si. Aproveita bem cada aperto de mão, cada abraço e cada beijo para passar para o próximo ou então acaba-se o tempo e não poderás realizar o teu desejo.
- Certo. E que mais?
- Quando estiveres dentro de cada um, faz o que puderes para dominar o corpo que invadiste. Obriga-os a tossir para tornar mais fácil e rápida a tua acção. E olha que não vai ser fácil, sobretudo com os mais jovens. Por isso, aproveita especialmente os mais velhos, em particular os que já estiverem doentes.
- Percebi. Não me parece nada difícil. Vai ser canja, hehehehe! Já me estou a ver: enorme, do tamanho do mundo, com o planeta todo às minhas ordens.
- Não te entusiasmes demasiado - disse a bruxa. - Ainda temos muito que fazer. Agora, salta para dentro do meu nariz e vamos ao trabalho!
O monstro minúsculo saltou para dentro do nariz da bruxa e começou a multiplicar-se. Esta disfarçou-se de velhinha simpática e foi até ao mercado, que àquela hora estava a abarrotar de gente. Na mão, levava uma cesta cheia de maçãs, vermelhinhas e sumarentas, para cima das quais havia tossido.
- Olh'ás maçãs vermelhinhas e sumarentas!!! - apregoava ela. - Quem quer comprar as minhas maçãs maduras e deliciosas?
Ao mesmo tempo, ia cirandando entre as bancas do mercado e tossindo para cima das pessoas e das mercadorias e tocando em tudo com as mãos sujas.
Constatando que poucos queriam comprar as maçãs, começou a oferecê-las:
- Olh'ás maçãs vermelhinhas e sumarentas!!! Ó freguês, pague uma e leve três!
A pouco e pouco, o monstro minúsculo começou a entrar pelos narizes e bocas das pessoas que por ali andavam, sem que estas dessem por isso. Quando encontravam algum amigo ou conhecido, as pessoas cumprimentavam-se efusivamente, ajudando assim a passar o monstro minúsculo que as contaminava.
Dias depois, começaram a surgir os primeiros sintomas da invasão: algumas pessoas sentiram-se muito cansadas, com febre e com tosse. As mais vulneráveis tiveram que ser hospitalizadas e, a cada dia que passava, apareciam mais casos. Algumas pessoas não resistiam...
Na sua cabana, a bruxa malvada gargalhava, a cada má notícia que ouvia sobre o assunto. Por seu lado, o monstro minúsculo andava nas suas sete quintas e crescia de dia para dia. Começou por ter sob o seu domínio uma cidade e depois outra e outra.
Quando já controlava o país inteiro, espalhou-se pelos restantes países. Os estrangeiros que estavam de visita levavam-no na bagagem para as suas terras e ajudavam, sem saber, à sua propagação.
O monstro minúsculo começou então a lançar na cabeça das pessoas a semente do medo. Não tardou que o pânico alastrasse e estas começaram a acumular comida e outros bens essenciais. Alguns até compraram armas. Mas esta era uma guerra invisível, porque ninguém sabia como combater o monstro minúsculo.
Os governantes dos países atingidos chamaram os feiticeiros oficiais, mas estes não sabiam como resolver o assunto. Chamaram então os cientistas e pediram-lhes ajuda. Os cientistas estudaram o problema e procuraram uma cura para a doença provocada pelo monstro minúsculo.
Descobriram que este só podia crescer quando as pessoas estavam em contacto entre si. Que se aproveitava de cada aperto de mão, cada abraço e cada beijo para passar de uma para outra. Aconselharam então as pessoas a mudarem os seus hábitos e a ter muito cuidado com a higiene. Aconselharam também que, os que pudessem, ficassem em casa. Só saíam os que tinham mesmo de trabalhar para dar resposta às necessidades do dia a dia.
Muitas pessoas assim o fizeram. Custava muito ficar em casa em vez de ir trabalhar, passear ou tratar dos assuntos habituais. Mas arranjaram maneiras de comunicar e de se apoiarem umas às outras. Vinham para as janelas e para as varandas cantar em conjunto, liam em voz alta, contavam histórias... E diziam umas às outras:
- Vamos ficar bem! Vamos ficar bem!
Assim, o tempo de que o monstro minúsculo dispunha para concretizar o seu plano maléfico ia-se esgotando. A pouco e pouco, voltava a ficar cada vez mais pequeno, o que o deixava tremendamente furioso.
A bruxa malvada acabou também por ser vítima do monstro minúsculo. Ele achava que a culpa do seu falhanço era dela, zangou -se e, como acontece neste tipo de histórias, empurrou-a para dentro do forno e a bruxa rebentou!
O monstro minúsculo ainda anda por aí, mas acredito que as pessoas, que somos todos nós, o iremos vencer. E, no final, vamos ficar bem!

2 comentários:

  1. Adoro! Um texto leve, divertido e pedagógico! Parabéns, estimado colega.

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  2. Boa! Parabéns! Vou publicar "O monstro minúsculo que queria ser rei" no blogue Biblioteclas.
    Grata por este conto esperando que se concretize! Saúde e até um dia destes!
    Bem haja!

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